quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Janela da Frente - JA NÃO HÁ NOTÍCIAS - António Manuel Ribeiro






Já não há notícias


Não amigos, não há, há repetições de lugares comuns, o mais do mesmo a que nos habituamos para continuarmos consumidores e clientes, utentes por vezes, em vez de cidadãos.
Para mim a notícia – triste, desgraçada – da manhã de ontem, quarta-feira, tinha a ver com a revelação de que Portugal não fizera progressos na luta contra a corrupção e descêramos um lugar no ranking. A notícia rainha substituta, filmada de todos os ângulos e com os esclarecimentos mais pueris levados à exaustão da vulgaridade, dissecava o acidente com o katamaran que faz a travessia do Tejo e provocara alguns feridos: o pico informativo aconteceu quando um canal de TV passou de 10 acidentados para 34 – o top estava conseguido.
As bicas pararam nos cafés de boca aberta para as televisões; no trânsito os noticiários suscitaram alguns toques e mais lentidão em que gosta de ver a desgraça alheia; na Assembleia da República os comentadores depenicavam-se porque o PSD ia votar ao lado do BE e da CDU contra a TSU. À noite, as explicações oriundas da pureza ideológica fizeram-me sorrir, o interesse da nação é substituído pelo chiste palavroso povoado de lugares-comuns, tão comuns, tão mais do mesmo. Já não há notícias. O governo governa à vista e a malta equilibra-se como pode sobre a jangada.
O país continua corrupto e mesmo assim há quem fale ex-cathedra sobre a necessidade de investimento externo. Como? Num país corrupto? Num país com uma política fiscal flutuante de ano para ano? Num país que paga empréstimos a 10 anos acima dos 4% e não vai crescer mais do que um por cento e qualquer coisa que logo se vê?
Precisamos de mais acidentes no Tejo para afastar o enfoque nos acidentes que virão certamente bater-nos à porta, se não deixarmos de navegar à vista.
 
António Manuel Ribeiro